Década de 1970
No âmbito nacional, os anos 70 caracterizam o auge ditatorial imposto pelo regime militar. Censura, prisões, assassinatos, corrupção e medo marcaram o país nesse período. As universidades brasileiras foram diretamente afetadas e passaram a viver sob profunda vigilância. Se, por um lado, o momento era de forte repressão na década que se inicia pouco mais de um ano após o decreto do AI-5, por outro, a UFSC se mostrou espaço de resistência e de contestação. O movimento estudantil se manteve ativo e articulado durante todo o período, com manifestações de alcance nacional, a exemplo da Novembrada.
O início da década de 1970 também assinala o fim do mandato do reitor João David Ferreira Lima, encerrado em 1971, após dez anos sob comando da instituição. Assume em seu lugar, para a gestão de 1972 a 1976, Roberto Mündel de Lacerda, que é seguido por Caspar Erich Stemmer (1976-1980). Ao longo da década, a UFSC passou por mudanças significativas em suas estruturas física e curricular. São realizadas obras importantes, e ocorre a consolidação do campus no bairro Trindade, bem como de alguns dos símbolos da instituição.
Confira alguns dos principais fatos da década:
- Reforma universitária
- Consolidação do campus da Trindade
- Inauguração da Igrejinha e do Teatro da UFSC
- Criação do Centro de Ciências Agrárias (CCA)
- Brasão e bandeira
- Retomada da construção do Hospital Universitário (HU)
- Criação da Apufsc
- Novembrada
Reforma universitária: A implementação da Reforma Universitária marcou fortemente o ambiente da UFSC na década de 1970. Os decretos-leis nº 53/66 e nº 252/67 já estabeleciam modificações e reformas nas universidades brasileiras, mas foi com a Lei nº 5.540/68 que a Reforma Universitária começou a se concretizar no país. O projeto educacional proposto visava à modernização do sistema de ensino aos moldes dos padrões estadunidenses.
Sem contar com a participação de alunos, professores ou da sociedade, reformas foram realizadas em todos os níveis de ensino durante o governo ditatorial. As mudanças foram precedidas por acordos entre o Ministério da Educação e Cultura e a United States Agency for International Development (Agência dos Estados Unidos para Desenvolvimento Internacional).
Entre as principais inovações da Reforma Universitária na UFSC está a criação do ciclo básico e, consequentemente, do Centro de Estudos Básicos (CEB) – do qual deriva o apelido “Básico” que permanece até hoje no bloco A do Centro de Comunicação e Expressão (CCE). Com o novo sistema, a Universidade deixa ser composta por faculdades e passa a ser dividida em centros e departamentos. Os alunos não ingressavam mais a partir da escolha por um curso, e sim por áreas do conhecimento. Por exemplo, quem desejasse estudar Medicina deveria optar pela área de Ciências Biológicas. Diante disso, ocorrem também mudanças no processo de seleção dos novos alunos, e, em janeiro de 1970, é realizado o primeiro vestibular único e unificado. A UFSC foi pioneira na realização do novo exame.
O CEB era a etapa inicial para todos os alunos. Após a conclusão do ciclo básico, o acadêmico começaria o ciclo profissionalizante com a graduação escolhida, caso tivesse obtido, na primeira etapa, nota suficiente para cursá-la. O Centro de Estudos Básicos mostrou-se, posteriormente, um dos principais problemas desse novo sistema. A concorrência entre alunos para ingresso em cursos muito procurados é trazida para dentro da universidade. Os dias de avaliações, portanto, eram bastante tensos e disputados. O foco nas provas padronizadas também enfraquecia a autonomia dos professores.
Em 1973, os alunos voltam a fazer suas opções por curso antes do ingresso, no ato da inscrição para o vestibular. Os departamentos, aos poucos, foram formando centros próprios, desarticulando-se do CEB, que é desfeito em 1976. Algumas mudanças trazidas pela Reforma Universitária, contudo, ainda permanecem atualmente, como a divisão por centros e departamentos, o semestre como unidade básica de estudo, no lugar do ano letivo, a matrícula por disciplinas e o sistema de créditos.
Consolidação do campus da Trindade: Em 1972, a Reitoria passa da Rua Bocaiúva, no Centro de Florianópolis, para o campus do bairro Trindade, e, em 1977, a venda do antigo prédio é efetivada. Em 24 de abril de 1978, a resolução nº 21/78 aliena os imóveis das antigas faculdades de Direito, Farmácia e Bioquímica, Medicina e Odontologia, localizados no centro da cidade. Nessa década foram construídas, ainda, várias das estruturas existentes hoje, como o prédio da Biblioteca Universitária (1976) e o Centro de Convivência (1979). É também em 1970 que o arquiteto Roberto Burle Marx projeta o jardim da Praça da Cidadania. Sua inauguração, contudo, ocorre apenas em 1992.
Inauguração da Igrejinha e do Teatro da UFSC: Em 1978, a UFSC passa a administrar os espaços da antiga Igreja Matriz da Trindade e da Casa do Divino, destinando-os ao Coral da UFSC e a cursos e oficinas de arte. A Igrejinha, como hoje é conhecida, foi restaurada e oficialmente inaugurada em outubro daquele ano. O prédio, que recebeu um mural do artista Hassis, foi convertido em um auditório de 126 lugares e passou a servir de sede para a então Seção de Atividades Artísticas, criada no ano anterior. Em maio de 1979, também o prédio do antigo Salão Paroquial é entregue à Seção e transformado no Teatro da UFSC – resultado do esforço conjunto da Universidade e do Grupo Pesquisa Teatro Novo da UFSC junto ao Instituto Nacional de Artes Cênicas.
O conjunto da Igrejinha da UFSC, que abriga o Teatro, o auditório da Igrejinha e outros espaços administrativos e de oficinas, é formado por edifícios históricos que fazem parte da paisagem cultural do bairro Trindade. A antiga “capela da freguesia da Santíssima Trindade” foi construída em 1848 e inaugurada oficialmente em 1853, época em que o bairro era ainda região rural da Ilha de Santa Catarina. Em sua estrutura, são preservados os materiais de construção da época, além de resquícios de utensílios utilizados nas cerimônias religiosas, como pias de água benta. Atualmente, a Igrejinha abriga o Departamento Artístico Cultural (DAC) e funciona como auditório de música para ensaios e apresentações de coral, madrigal e orquestra de câmara, além de sediar cursos, oficinas, seminários, palestras e apresentações de peças de teatro.
Criação do Centro de Ciências Agrárias (CCA): O Centro Agropecuário, como era chamado à época, já estava previsto no plano da Reforma Universitária, e sua criação foi aprovada por meio do Decreto nº 64.629/69. Seus trabalhos de estruturação, contudo, começaram em 1971, em uma parceria entre a UFSC e o Governo do Estado, por meio da Secretaria de Agricultura e da Associação de Crédito e Assistência Rural de Santa Catarina (Acaresc).
A implantação definitiva do centro ocorreu em 1975, com a criação do Curso de Agronomia. O convênio com o Governo do Estado possibilitou a utilização das instalações e dos equipamentos e o aproveitamento do pessoal dos quadros da Secretaria de Agricultura e da Acaresc, que cedeu também o terreno para a construção do primeiro centro fora da Trindade.
Brasão e bandeira: Há registros de uso do brasão da UFSC desde a década de 60, porém, somente em 1976 seu uso é institucionalizado, a partir da Portaria 267/76. De autoria do professor Oswaldo Rodrigues Cabral, fundador do Museu Universitário, o brasão consiste em elementos que caracterizam a história da padroeira de Santa Catarina e valores da própria universidade. As cores e as formas do brasão inicial eram o mais realista possível, e, por não haver um padrão estabelecido, ocorreu uma abertura para as mais diversas variações. Hoje, é utilizada uma versão mais simplificada, com menos cores e detalhes, mas sempre remetendo aos elementos originais.
A bandeira, por sua vez, foi criada em 1971 pelo artista Hassis, e sua oficialização ocorreu também em 1976, com a Portaria nº 266/76. A bandeira consiste em dois “Us” graficamente jogados para cima e para baixo, unidos. Segundo o autor, “é um centro de energia viva, em que suas linhas contínuas cruzam o mesmo ideal, daí a ponte para o relacionamento humano, universidade aberta, consciência, comunidade e desenvolvimento”. As cores seguem a base do brasão da UFSC, azul e amarelo: a área retangular azul simboliza o Universo, enquanto a circunferência amarela simboliza o Sol, o centro das energias, o campus universitário.
Retomada da construção do Hospital Universitário (HU): As obras do Hospital Universitário, inicialmente chamado de Hospital das Clínicas, começaram ainda na década de 1960, mas passaram anos paralisadas por falta de recursos. A mobilização dos estudantes foi fundamental para sua retomada. Destacam-se as manifestações lideradas pelo Diretório Acadêmico do Centro Biomédico em 1973 , que ultrapassaram os limites do campus, com passeatas e distribuição de adesivos no centro da cidade, e obtiveram amplo apoio da população.
Os estudantes, então, entraram em contato com o Planalto e realizaram uma reunião com o ministro da Educação Jarbas Passarinho, em Brasília. A importante pressão realizada pelo movimento estudantil fez com que a Reitoria se sentisse constrangida e também se movimentasse em prol do Hospital, criando uma comissão de estudos para sua implementação. As obras foram retomadas em 1975. Sua inauguração oficial ocorreu em 2 de maio de 1980, já com o nome de Hospital Universitário.
Criação da Apufsc: O Sindicato dos Professores das Universidades Federais de Santa Catarina (Apufsc) foi fundado, com o status de associação, no dia 24 de junho de 1975, época em que os servidores públicos eram proibidos de se organizar em sindicatos. Inicialmente, a entidade tinha como objetivo reunir os professores da UFSC para troca de ideias e confraternizações. A Apufsc entrou na luta pela redemocratização do Brasil e participou dos movimentos de enfrentamento ao regime militar e pelos direitos dos professores.
Novembrada: No dia 30 de novembro de 1979, Florianópolis registrou um dos mais significativos protestos políticos da sua história. A Novembrada transformou-se em símbolo de resistência e enfrentamento à ditadura militar, com repercussão nacional.
A mobilização estudantil, capitaneada pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFSC, insurgiu contra o presidente João Figueiredo. Naquele dia, uma placa seria inaugurada, na Praça XV de Novembro, em homenagem a Floriano Peixoto, segundo presidente da República e responsável pelo massacre de 200 pessoas em Anhatomirim. Além do descontentamento com o ato, o protesto também teve como motivação o constante aumento do custo de vida, em especial dos combustíveis.
A multidão se concentrou em frente ao atual Palácio Cruz e Sousa, onde se encontrava o então presidente. Quando Figueiredo desce da sacada do Palácio, cercado por seguranças, e se aproxima dos manifestantes, tem início o tumulto com a polícia. A manifestação foi reprimida com violência, e sete estudantes foram presos, indiciados pela Lei de Segurança Nacional: Adolfo Luiz Dias, Lígia Giovanella, Marise Lippel, Newton Vasconcellos, Rosângela Koerich, Geraldo Barbosa e Amilton Alexandre, o “Mosquito”. Diversos protestos foram realizados exigindo a libertação dos estudantes, soltos dias depois.
Novembrada, 30 de novembro de 1979. Fotos: Acervo Agecom/UFSC
Para entender melhor o contexto político da época e o que representou a Novembrada, confira o episódio do programa “UFSC Explica” sobre o tema, produzido pela Agência de Comunicação da UFSC (Agecom):
Fontes:
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