Década de 1980

O movimento estudantil, que em novembro de 1979 havia promovido a Novembrada, entrava na década de 80 embalado pela luta pela redemocratização. Foi uma década marcada por greves e assembleias de servidores e estudantes, além de uma ocupação da Reitoria. A expansão do campus continuou, com a finalização de obras e inaugurações do Hospital Universitário e dos prédios do Centro de Ciências da Saúde (CCS), do Centro Socioeconômico (CSE) e do Colégio de Aplicação. Foi em 1983 que a UFSC escolheu seu primeiro reitor por meio de eleição direta paritária e com pesos equivalentes entre docentes, técnicos e estudantes.

O reitor eleito pelo voto da comunidade universitária foi Rodolfo Joaquim Pinto da Luz – dirigente máximo entre 1984 e 1988. Outros três reitores da década foram Caspar Erich Stemmer, que deixou o cargo em 1980; Ernani Bayer, que assumiu a reitoria de 1980 a 1984; e Bruno Rodolfo Schlemper Junior, reitor entre 1988 e 1994. 

Rodolfo Pinto da Luz voltou a eleger-se para outros dois mandatos de reitor (1996-2000 e 2000-2004).

Confira alguns dos principais fatos da década:

Os prédios modulados da UFSC em 1980. Foto: Acervo Agecom/UFSC

A UFSC aos 20 anos: Quando completou 20 anos de existência, a UFSC ocupava uma área de três milhões de metros quadrados e era constituída por dez centros: Ciências Físicas e Matemáticas, Ciências Humanas, Comunicação e Expressão, Ciências Biológicas, Ciências da Saúde, Tecnológico, Socioeconômico, Ciências da Educação, Ciências Agrárias e Desportos. Eram oferecidos 53 cursos de graduação, 13 de mestrado, um de doutorado e vários de especialização. Na pesquisa, a Universidade contava com 250 projetos, em 37 áreas.

Capa do primeiro livro publicado pela Editora da UFSC

A UFSC tinha pouco mais de 10 mil alunos, e ofertava a cada ano 2.700 vagas no vestibular. Lecionavam 1.528 professores. O Restaurante Universitário (RU) servia diariamente 5 mil refeições, e a Biblioteca Central dispunha de 36.800 títulos, em cerca de 100 mil exemplares. Havia o Colégio de Aplicação e colégios agrícolas em Camboriú e Araquari, além de dois campi avançados no Pará, às margens do Rio Tapajós, para trabalho de extensão junto à comunidade local, assim como os projetos de extensão da UFSC que já aconteciam em todo o estado de Santa Catarina. 

Às vésperas de completar 20 anos, a UFSC cria a sua editora. A EdUFSC foi instituída por resolução em 30 de outubro de 1980 e regulamentada em 12 de dezembro daquele ano, por portaria. No primeiro ano, a EdUFSC lançou 12 títulos. O primeiro diretor-executivo foi o professor João Nilo Linhares, com gestão no período compreendido entre março de 1981 e dezembro de 1982. O Conselho Editorial inicial contava com os seguintes professores: Silvio Coelho dos Santos – presidente; Carlos Humberto P. Corrêa; José Edú Rosa; Paulo Henrique Blasi; Rosa Weingold Konder; Walter Celso de Lima; e João Nilo Linhares.

Ocupação da Reitoria, em 1980. Foto: Acervo Agecom/UFSC

Greves e movimento estudantil: Estudantes protestando por melhorias no ensino. Professores reivindicando melhorias salariais. Em 17 de novembro de 1980, sob a gestão do reitor Ernani Bayer, a UFSC aderiu à Primeira Greve das Federais Autárquicas. Foi o primeiro movimento grevista de servidores públicos federais no regime militar, ainda às sombras do AI-5. A greve durou 26 dias.

Reivindicavam-se melhores salários e a destinação de mais verbas para a educação no orçamento federal. Participaram docentes da UFSC e de outras 18 universidades autárquicas, além de professores de sete escolas isoladas. Com a greve, foram conquistados aprovação do decreto que estabelecia novos planos de carreira no Magistério Superior e de 1º e 2º Graus e reajuste de 35% para janeiro de 1981 e 35% para cumulativos em abril, resultando em 82,25% de aumento para os servidores.

Em 1981, os movimentos docentes dentro das universidades autárquicas ganharam novo apoio, a criação da Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior (Andes), que em fevereiro de 1982 realizou seu primeiro Congresso, na UFSC. A Apufsc sediou o evento no campus, que se transformou em uma grande assembleia nacional.

Em 1983, uma nova greve, de 32 dias, veio com reivindicação de reposição salarial e outras demandas, de docentes e técnicos administrativos. Em 1984, uma greve significativa, com duração de 84 dias mobilizou professores e técnicos da UFSC e de outras instituições, sem sucesso nas negociações.

Assembleia de professores e alunos, em 1981. Foto: Acervo Agecom/UFSC

O ano de 1987, após a redemocratização, com José Sarney na Presidência do Brasil e Rodolfo Joaquim Pinto da Luz na reitoria da UFSC, foi marcado por uma greve de 44 dias, com a participação de professores de 45 Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes), incluindo professores de autarquias e fundações. Após o período de paralisação e negociações, o resultado da greve foi a aprovação da lei que permitiu unificar o regime jurídico das autarquias e fundações, gerando um aumento salarial significativo para os docentes das Ifes.

A escolha para a Reitoria: Em 1983, a UFSC iniciava o processo de escolha do novo reitor. Reivindicação dos movimentos estudantis e de servidores, a consulta democrática para escolher o reitor começou com a votação da comunidade universitária, nos dias 10 e 11 de novembro daquele ano. Em abril de 1984, o Jornal Universitário abordava a nomeação do novo reitor, enquanto a UFSC aguardava que o presidente da República referendasse a escolha da comunidade universitária. “Houve uma participação maciça. Foi uma eleição igual a qualquer outra, precedida de campanhas, comícios e promessas. A exceção: foi limpa e transcorreu em alto nível”, diz a edição do jornal. Os mais votados, pela ordem, foram: Rodolfo Pinto da Luz, Oswaldo de Oliveira Maciel, Alvaro Reinaldo de Souza, Alzira Hessmann Dutra, Arno Bollmann e Ana Maria Beck. O processo de escolha foi paritário, com peso de um terço para cada categoria (docente, técnico e discente). Após a consulta, a lista foi homologada pelo Colégio Eleitoral, formado pelos membros dos três Conselhos da Universidade – o Conselho Universitário (CUn), o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) e o Conselho de Curadores. “O compromisso de todos os candidatos: encampar, para reitor, o nome mais votado”, diz a matéria do JU, que entrevistou todos os candidatos e trouxe algumas promessas comuns: “a defesa do ensino público e gratuito, mais verbas, melhores salários e mais democracia”.

Hospital Universitário: As obras do Hospital Universitário foram concluídas em 1980, e sua inauguração realizada pelo então reitor Caspar Erich Stemmer. Primeiramente chamado de “Hospital das Clínicas da Universidade de Santa Catarina”, depois “Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina” e por fim “Hospital Universitário Prof. Polydoro Ernani de São Thiago”, em homenagem ao professor e médico que foi seu primeiro diretor. Fundamental para a chegada dos cursos de Ciências da Saúde na Trindade, o HU solidificou a assistência, o ensino e a pesquisa em Saúde na UFSC.

Nos anos 80, destacam-se os primeiros marcos do HU. No início de 1980, terminava a construção principal e eram realizados os acabamentos e o aparelhamento do hospital, de forma que, em março, ocorria a posse de seu primeiro diretor, o professor Polydoro Ernani de São Thiago, e o HU já funcionava com duas unidades de internação de Clínica Médica e a nível ambulatorial. A solenidade de inauguração do HU-UFSC ocorreu no dia 2 de maio de 1980. Em janeiro de 1981, o professor Nelson Grisard foi designado para assumir a Direção-Geral do HU-UFSC no lugar do professor Polydoro. E, em 7 de fevereiro de 1983, foi realizado o primeiro ato cirúrgico no HU-UFSC, no Centro Cirúrgico recém-instalado, pela equipe do Departamento de Ensino de Clínica Cirúrgica. A década ainda reservava para o HU a instalação de equipamentos de ponta para a época, como a Gama Câmara do Laboratório de Radioisótopos, aberta em março de 1984, com equipamento para exames de medicina nuclear.

Vista aérea do HU, Centro de Ciências da Saúde e campus da UFSC na Trindade em 1989. Foto: Acervo Agecom/UFSC

Expansão: O Centro de Ciências da Saúde (CCS) foi se formando gradativamente ao longo dos anos 80. O primeiro curso foi o de Enfermagem, que chegou ao CCS em 1980 com a inauguração do prédio. Após a inauguração do HU, o curso de Medicina mudou-se de forma progressiva para a Trindade, à medida que os ambulatórios das especialidades ficavam prontos no Hospital. Em 1985, foi criado o Departamento de Nutrição, sendo o 11º do CCS.

Também foram inaugurados na década de 1980, o Centro Socioeconômico (CSE) e o prédio do Colégio de Aplicação. A Fazenda Experimental da Ressacada foi doada à UFSC em 1982, pelo Governo do Estado de Santa Catarina, no Bairro Tapera, em Florianópolis. A propriedade sofreu invasões e foi objeto de discussões internas no Centro de Ciências Agrárias (CCA), o que adiou sua efetiva utilização para as atividades de ensino, pesquisa e extensão. Apenas em 1989, após a doação de animais pertencentes à Embrapa, devido à desativação do projeto Gado Crioulo Lageano, a Fazenda recebeu suas primeiras benfeitorias, como cercas e a casa do vigia e capataz, visando alojar as vacas oriundas do projeto.

A pesquisa na UFSC ganhou fôlego nos anos 80, com avanços nos trabalhos com moluscos, ostras, peixes e camarões. Os laboratórios foram ganhando computadores e investimentos para equipamentos. Projetos de extensão e de pesquisa começavam no Centro Tecnológico, com a construção de veículos para competições, por exemplo. À medida que os cursos ganhavam infraestrutura, a UFSC recebia investimentos para suas pesquisas. Em outubro de 1983, o professor Silvio Coelho dos Santos, um dos principais etnólogos do Brasil e pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação naquele ano, escrevia para o Jornal Universitário, às vésperas da IV Semana da Pesquisa:

“Pesquisa e ensino num país dependente, periférico, tem que simultaneamente atender às aspirações do indivíduo (pesquisador ou estudante), e da coletividade. Ou seja, sem cercear os interesses individuais, é necessário considerar o que é conveniente e adequado em termos coletivos, com vistas ao alcance crescente de autonomia e independência. Assim, a tarefa básica da Universidade não deve ser a habilitação de profissionais para o mercado de trabalho. O importante é preparar tais profissionais para atuarem na realidade social, com vistas à sua mudança.”

Movimentos culturais: A década mais uma vez trouxe aos palcos da UFSC grandes eventos, não só palestras e debates, mas também saraus, festas e shows. Apesar das restrições impostas pela ditadura, as festas lotavam. Entre as bandas de maior sucesso, a preferência estudantil era pelo grupo “Engenho”. Apresentações marcantes também incluem a Chicago Jazz Band, em 1981, e Nei Lisboa, em 1983.

Em 1981, a UFSC recebia uma plateia de cerca de 4 mil pessoas para assistir à aula inaugural com o maestro Isaac Karabtchevsky. Em frente ao prédio da Reitoria, a primeira aula inaugural proferida por um músico era novidade, nunca havia acontecido no Brasil (JU, nº 34, Abril 1981). De acordo com o Jornal Universitário, o objetivo do maestro era “desmistificar a música erudita”, com explicações simplificadas das notas musicais e muitos exemplos. O maestro se apresentou, na ocasião, com a Orquestra de Câmara de Florianópolis e o Coral da UFSC, “que executaram desde ‘Carinhoso’ de Pixinguinha até ‘Aleluia’, de Handel”.

Millôr Fernandes visita a Ilha de Anhatomirim., em 1983. Foto: Jones Bastos/Agecom/UFSC

Palestraram na UFSC nomes como o romancista Ignácio de Loyola Lopes Brandão, atualmente membro da Academia Brasileira de Letras; o político Luiz Carlos Prestes; os humoristas Millôr Fernandes e Jaguar, criadores do Pasquim, entre outros.

Franklin Cascaes, falecido em 1983, era presença frequente na UFSC, onde anualmente montava um presépio de Natal, além de exposições de arte, oficinas, e aulas. Outro artista que atuava na UFSC era o poeta e professor Osmar Pisani, com obras premiadas, como o Prêmio Cruz e Sousa, em 1981, quando Osmar recebeu um prêmio em dinheiro e o título de “Maior Poeta da Atualidade”, no estado de Santa Catarina. A comissão julgadora incluía Ferreira Gullar, Adonias Filho, Fausto Cunha, Armindo Trevisan e Marcos Konder Reis, e destacou Osmar dentre 120 concorrentes.

Importante estrutura de apoio à cultura na UFSC, o Teatro foi reaberto em 1989, depois de passar por reformas. No mesmo ano, foi inaugurada a Galeria de Arte, um novo espaço para a cultura no Centro de Convivência.

Fortalezas: Após um período de abandono e ruínas, as fortalezas foram restauradas sob a coordenação da UFSC nas décadas de 1980 e 1990, em conjunto com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e outras entidades parceiras. A Fortaleza de Santa Cruz de Anhatomirim está sob a gestão da UFSC desde 1979 e foi aberta à visitação pública em 1984. A Fortaleza de Santo Antônio de Ratones passou à guarda da UFSC em 1991 e foi aberta ao público no ano seguinte. Por fim, a Fortaleza de São José da Ponta Grossa, aberta ao público em 1992, também vem sendo gerenciada pela Universidade Federal desde esse ano.

 

Fontes:

4 mil pessoas na aula magna proferida por Karabtchevsky. Jornal Universitário. Florianópolis, p. 12. abril 1981. Disponível em: <https://arquivos.ufsc.br/f/47c0e17a72c14a959523/>. Acesso em: 08 out. 2020 

CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS. História da Fazenda. Disponível em: <https://fazenda.ufsc.br/historia/>. Acesso em: 12 mar. 2020.

Concurso dá a Osmar Pisani o prêmio de Melhor Poeta de SC. Jornal Universitário. Florianópolis, p. 10. maio e junho 1981. Disponível em: <https://arquivos.ufsc.br/f/a8a99bdc5c0243d9ad88/>. Acesso em: 08 out. 2020

NECKEL, Roselane; KÜCHLER, Alita Diana C. (Org.). UFSC 50 anos: trajetórias e desafios. Florianópolis: UFSC, 2010. Disponível em: <https://agecom.paginas.ufsc.br/files/2010/12/Livro_UFSC50Anos_2010_web.pdf>. Acesso em: 14 fev. 2020.

Reitoráveis defendem democracia, salários e mais verba.  Jornal Universitário. Florianópolis, p. 6. abril 1984. Disponível em: <https://arquivos.ufsc.br/f/79f444ce79ea47289656/>. Acesso em: 08 out. 2020

SANTOS, Silvio Coelho dos. É preciso discutir mais. Jornal Universitário. Florianópolis, p. 1. outubro 1986. Disponível em: <https://arquivos.ufsc.br/f/7693d0475b0c42dc9516/>. Acesso em: 09 out. 2020